O presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, discursa após referendo consultivo sobre a soberanía de Esequibo (AFP/AFP Photo)
O presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, anunciou por meio de suas redes sociais que os eleitores do país que participaram do referendo realizado nesse domingo (3) aprovaram as medidas que podem resultar na anexação de parte do território da Guiana.
Maduro fez uma transmissão ao vivo na qual discursa após a divulgação do resultado.
Na descrição do vídeo, escreveu: “Celebração da grande vitória do povo da Venezuela no referendo consultivo pela defesa da nossa Guiana Essequiba.”
As cinco perguntas do referendo foram aprovadas com mais de 95% de aprovação, segundo a autoridade eleitoral do país.
Os eleitores rejeitaram a jurisdição da Corte Internacional de Justiça sobre a longa disputa territorial do país com a vizinha Guiana e apoiaram a criação de um novo Estado na região de Essequibo.
O tribunal proibiu a Venezuela de tomar qualquer medida que pudesse mudar o status quo na área, mas o governo do presidente Nicolás Maduro avançou com um referendo “consultivo” de cinco perguntas.
Disputa histórica A Venezuela alega que o território lhe foi tirado em 1899 na sentença arbitral de Paris, que qualificou como sem efeito denúncia de irregularidades em procedimento de 1962 perante a ONU.
Por sua vez, a Guiana rejeitou este referendo e solicitou ao Tribunal Internacional de Justiça que emita uma ordem de emergência contra o resultado da consulta popular, uma vez que, defende, o território que lhe pertence.
Dados básicos
O território reivindicado pela Venezuela é de cerca de 160 mil km2.
A população estimada de Essequibo é de 125 mil habitantes, dos mais de 791 mil habitantes da Guiana.
Atuais líderes políticos dos partidos em disputa: Nicolás Maduro (Venezuela) e Irfaan Alí (Guiana).
Guiana controla a área reivindicada pela Venezuela desde 1966, quando alcançou a independência do Reino Unido, que representa aproximadamente dois terços de seu território
Idioma: O inglês é falado na área reivindicada, sendo este um dos poucos territórios da América do Sul com esse idioma oficial, além das Malvinas-Falklands. Enquanto isso, o espanhol é falado na Venezuela, como em grande parte da região.
O que há na área disputada? A área reivindicada pela Venezuela, marcada nos mapas do país com listras diagonais, está localizada a oeste do rio Essequibo, que fica na Guiana.
Embora seja um território maioritariamente constituído por uma selva praticamente impenetrável, é ao mesmo tempo próspero e rico em recursos naturais e minerais, com uma flora e fauna variadas.
Em 2015, a ExxonMobil divulgou ter encontrado petróleo na costa da Guiana. A área tem potencial agrícola e também possui reservas de diamantes, ouro e bauxita.
Marcos históricos: 1810 –– A Venezuela declara sua independência da Espanha no território que em 1777 correspondia à Capitania Geral da Venezuela. Essa declaração incluía a área que chegava à margem esquerda do rio Essequibo.
1814 –– Em plena guerra de independência, os britânicos tomam posse das colônias de Demerara, Berbice e Essequibo, que, em 1831, passaram a fazer parte do que foi chamado de Guiana Inglesa, território a leste do rio Essequibo.
1840 –– Como o limite ocidental da Guiana Inglesa não estava definido, o Reino Unido encarregou Robert Shomburgk, explorador alemão, que anos antes havia realizado estudos botânicos na área, de traçar um mapa com os limites entre aquela Guiana Inglesa e seus vizinhos, incluindo a Venezuela. O resultado ainda hoje é conhecido como Linha Shomburgk, que localiza a fronteira da Venezuela na foz do rio Orinoco. Em 1841, a Venezuela reagiu afirmando que lhe foram tirados seus territórios localizados a oeste de Essequibo.
1850 –– O Reino Unido e a Venezuela concordaram que a área disputada não seria ocupada e a definiram como território disputado.
1897 –– Com a mediação dos Estados Unidos, a Venezuela e o Reino Unido concordaram em respeitar o resultado de uma arbitragem internacional com a participação da Inglaterra, da Rússia e dos Estados Unidos, este último representando a Venezuela.
1899 –– A sentença arbitral de Paris concede à Grã-Bretanha a soberania sobre toda a área em disputa e deixa à Venezuela uma porção de terra ao sul e a foz do rio Orinoco.
1962 –– A Venezuela denunciou perante a Organização das Nações Unidas que havia vícios no procedimento de arbitragem e deixou claro que considerava a decisão da sentença nula e sem efeito. A nação argumenta que uma carta póstuma de um dos árbitros americanos evidenciou, o que ele afirma sido, um suposto compromisso entre o presidente russo no tribunal e os representantes britânicos para alcançar uma decisão unânime contrária a Caracas.
1966 –– É assinado o Acordo de Genebra, no qual o Reino Unido reconhece que existe uma disputa por aquele território. Nesse mesmo ano, a Guiana alcançou a sua independência e iniciaram-se negociações diretas entre os dois países sobre a disputa territorial.
1970 –– Por iniciativa do Primeiro Ministro de Trinidad e Tobago, Eric Williams, Venezuela, Guiana e Reino Unido aprovaram em 18 de junho o Protocolo de Porto Espanha, que estabeleceu um prazo de 12 anos.
1986 –– As partes recorreram novamente à ONU para desbloquear a disputa e chegar a acordo sobre a nomeação de um mediador. A partir desse momento foram nomeados três oficiantes. O último deles, Norman Girvan, morreu em 2014 sem ter conseguido soluções para a disputa territorial. Também não houve novos pedidos das partes na ONU para nomear um novo mediador.
2015 –– A ExxonMobil descobriu petróleo na área reivindicada pela Venezuela.
2018 –– A Guiana processou a Venezuela perante o Tribunal Internacional de Justiça por essa instância para confirmar a validade da sentença arbitral de Paris de 1899.
2020 –– Em dezembro, o Tribunal Internacional de Justiça decidiu que tinha jurisdição para julgar o caso, algo que a Venezuela não reconhece.
2021 –– O governo da Venezuela emitiu uma declaração reafirmando o domínio sobre o Essequibo. A Guiana reagiu a tal declaração considerando-a uma ameaça à sua soberania e integridade territorial.
2023 –– Em setembro, a Assembleia Nacional da Venezuela convocou seus cidadãos para um referendo sobre Essequibo.
2023 –– Em outubro, a Guiana solicitou ao Tribunal Internacional de Justiça a suspensão do referendo promovido pela Venezuela.
2023 –– Em 15 de novembro de 2023, a Venezuela apresentou seus argumentos perante o tribunal internacional sobre a realização do referendo. A vice-presidente Delcy Rodríguez defendeu o direito do seu país de “consultar-se e ouvir-se” e denunciou que a Guiana concedeu concessões de petróleo e gás na área disputada.
2023 –– Em 3 de dezembro, a Venezuela realizou um referendo com 5 perguntas. Segundo o governo venezuelano, 95% votaram favoráveis à anexação