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20/11/2024 às 07h38min - Atualizada em 20/11/2024 às 07h30min

O Legado de Celso Furtado

Paulo Galvão Júnior (1) & Katherine Buso (2)

Paulo Galvão Júnior

Paulo Galvão Júnior

Economista paraibano, autor de 18 e-Books de Economia, conselheiro do CORECON-PB e diretor secretário do Fórum Celso Furtado de Desenvolvimento da PB.

Celso Monteiro Furtado (1920-2004)
Considerações Iniciais
 
O presente artigo apresenta novas reflexões sobre o legado de Celso Furtado, nas homenagens alusivas aos 20 anos da morte do maior economista brasileiro de todos os tempos. O economista paraibano Celso Monteiro Furtado (1920-2004) permanece, duas décadas após seu falecimento no Rio de Janeiro, como um dos mais proeminentes pensadores do Brasil, o quinto maior país em extensão territorial, o sétimo país mais populoso do mundo e a nona maior economia do planeta na atualidade.
 
Sua rica e vasta obra influenciou o entendimento do desenvolvimento econômico e do subdesenvolvimento de forma ímpar, especialmente, em regiões brasileiras, como o Nordeste, que sempre foi central em seus estudos, pesquisas, reflexões e preocupações. Sua trajetória se destacou pela visão crítica sobre o papel da industrialização e do planejamento econômico no combate às desigualdades regionais e sociais, inspirando gerações de economistas, sociólogos e formuladores de políticas públicas no Brasil.
 
Celso Furtado foi um dos intérpretes do Brasil e pioneiro ao desafiar o conceito de que o subdesenvolvimento seria um estado transitório e temporário. Em sua visão, o subdesenvolvimento se estruturava como um fenômeno associado ao contexto global e ao modelo de inserção do Brasil e de outras nações latino-americanas no capitalismo mundial. Essa perspectiva marcou um avanço na teoria econômica latino-americana, influenciada pela Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL), com sede na capital do Chile, onde atuou como economista brasileiro, entre 1949 e 1957, ao lado do grande economista argentino Raúl Prebisch (1901-1986).
 
A Relevância Atual do Pensamento Furtadiano
 
Passadas duas décadas desde sua morte, aos 84 anos, a obra de Celso Furtado permanece como uma bússola para compreender os desafios contemporâneos do Brasil, como também, de outras nações em desenvolvimento, como a Argentina, a Venezuela e o México. Sua crítica à desigualdade social no Brasil, pode ser mensurada nos dias atuais, ao ser revelado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que são 16,4 milhões de pessoas morando em favelas no país, e a maior favela brasileira é a Rocinha, com 72 mil moradores, no Rio de Janeiro.
 
O Brasil é um país membro do Grupo dos Vinte (G20) e do BRICS Plus, todavia, enfrenta sérios desafios como a concentração de renda. As desigualdades econômicas permanecem elevadas, exigindo políticas públicas que combinem crescimento econômico com distribuição equitativa da renda. Nos dias atuais, a Paraíba, terra natal de Celso Furtado, apresenta a pior concentração de renda do Brasil, com um Índice de Gini de 0,558 em 2023, segundo o IBGE. Esse Coeficiente de Gini elevado evidencia o agravamento das desigualdades sociais, com os ricos ficando cada vez mais ricos, enquanto, os pobres enfrentando condições cada vez mais precárias.
 
Outra desafio é a sustentabilidade ambiental. As questões climáticas e de preservação de recursos naturais, enfatizadas por Furtado, tornaram-se urgências globais. Além do desafio da educação no Brasil. Investimentos em educação, uma das bandeiras defendidas por Furtado, são essenciais para superar a dependência tecnológica. Hoje, o Brasil tem 11,4 milhões de pessoas analfabetas no ano de 2022, conforme IBGE.
 
Além disso, o debate em torno do papel do Estado no planejamento econômico, frequentemente desprezado por abordagens neoliberais, ressurgiu com força em face de crises recentes, como a pandemia da COVID-19 e a instabilidade geopolítica mundial.
 
Novos Caminhos para o Legado de Celso Furtado
 
A influência de Celso Furtado transcende o campo acadêmico, inspirando movimentos que buscam justiça social e igualdade econômica. Sua obra continua a desafiar formuladores de políticas públicas a pensarem em modelos inclusivos, que priorizem o bem-estar das populações vulneráveis. Movimentos atuais que dialogam com suas ideias incluem as iniciativas de desenvolvimento regional, que são programas voltados ao fortalecimento do Nordeste e outras regiões menos favorecidas.
 
A transição energética justa demanda investimentos robustos em fontes renováveis, como energia solar, eólica e biomassa, bem como em tecnologias sustentáveis que alinhem progresso econômico à responsabilidade ambiental. O Brasil é uma referência mundial no campo da energia limpa e renovável, por exemplos, na Paraíba, são visíveis as usinas solares no Sertão Paraibano, as usinas eólicas no Litoral Norte do estado, como também, as usinas de etanol na Mata Paraibana. Já no estado mais rico e mais populoso do Brasil, São Paulo, são visíveis também as placas solares na cidade de Pereira Barreto, os aerogeradores na região de Presidente Prudente, além das usinas de etanol nas regiões de São José do Rio Preto, de Ribeirão Preto e de Bauru, por exemplos.
 
As Contribuições de Celso Furtado ao Desenvolvimento Econômico Latino-Americano
 
Celso Furtado, um dos mais renomados economistas da América Latina, foi um dos pilares do pensamento econômico latino-americano ao longo do século XX. Sua trajetória está intrinsecamente ligada ao desenvolvimento de teorias e políticas que buscaram enfrentar o desafio histórico do subdesenvolvimento, especialmente em uma região marcada por profundas desigualdades sociais, econômicas e regionais.
 
De acordo com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), a América Latina foi apontada com a região do mundo com a maior desigualdade de renda no Relatório de Desenvolvimento Humano 2023/2024. A América Latina é formada por 20 países. Já o Caribe é composto por 13 países.
 
A Teoria do Subdesenvolvimento e o Contexto Latino-Americano
 
Furtado desafiou as teorias econômicas tradicionais, que tratavam o subdesenvolvimento como um estágio temporário no caminho do progresso econômico. Em vez disso, ele argumentou que o subdesenvolvimento era um fenômeno estrutural, moldado pelas relações desiguais entre países centrais e periféricos no sistema capitalista global. Sua visão aliada ao mestre Raúl Prebisch evidenciava que o crescimento econômico em países centrais (hoje, leiam-se países desenvolvidos) muitas vezes reforçava as condições de dependência e atraso nos países periféricos (hoje, leiam-se países emergentes).
 
Essa análise cepalina, consolidada em obras como Formação Econômica do Brasil, de 1959, e Subdesenvolvimento e Estagnação na América Latina, de 1966, influenciou e contribuiu para a busca de novos modelos de desenvolvimento que rompessem com a lógica de exploração externa dos países centrais, como os Estados Unidos, perante aos países periféricos, como o Brasil.
 
Planejamento Econômico e Desenvolvimento Regional
 
Outra relevante contribuição de Furtado foi à defesa do planejamento econômico como ferramenta estratégica para promover o crescimento econômico inclusivo. Ele acreditava que o Estado deveria desempenhar um papel ativo na industrialização e na superação de desigualdades regionais e sociais.
 
No Brasil, essa visão foi implementada na criação da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE), em 1959, em Recife, da qual foi o primeiro superintendente. A SUDENE buscava combater a pobreza estrutural do Nordeste, promovendo investimentos em infraestrutura e iniciativas produtivas voltadas a industrialização da região.
 
Sustentabilidade e Autonomia
 
Furtado também trouxe à tona debates lúcidos sobre a importância de preservar os recursos naturais, criticando a exploração desmedida dos recursos finitos da Terra para sustentar o padrão de vida de uma sociedade consumista, focada em bens e serviços, mas desatenta às consequências ambientais, como a poluição do ar e do mar. Sua obra O Mito do Desenvolvimento Econômico, de 1974, é um dos melhores livros do célebre economista paraibano.
 
Furtado defendeu também a garantia da autonomia tecnológica nas nações, destacando que o fortalecimento das capacidades internas era essencial para o desenvolvimento econômico. Ele criticava veementemente a dependência excessiva de capitais estrangeiros, argumentando que essa prática comprometia a soberania e limitava o progresso sustentável das economias periféricas.
 
Sua crítica ao consumismo, a dependência de capitais externos e à falta de autonomia tecnológica tornam-se ainda mais relevante em um mundo globalizado e em constante transformação digital e sofrendo com as mudanças climáticas, a Guerra na Ucrânia e a Guerra em Israel.
 
O Legado de Celso Furtado na América Latina e no Caribe
 
O impacto de Celso Furtado transcende o Brasil. Suas ideias influenciaram políticas públicas e movimentos sociais em toda a América Latina, em todo o Caribe, promovendo um debate mais profundo sobre o papel das economias periféricas no sistema global. Ao destacar a importância de modelos alternativos de desenvolvimento, sua obra continua a inspirar economistas, líderes e acadêmicos a buscar soluções que equilibrem crescimento econômico, justiça social e sustentabilidade.
 
Assim, Celso Furtado permanece um ícone do pensamento latino-americano e caribenho, lembrado não apenas por suas análises brilhantes, mas por seu compromisso com um futuro mais equitativo e independente para as duas regiões do continente americano.
 
O Legado Internacional de Celso Furtado
 
Celso Furtado deixou uma marca indelével não apenas na América Latina e no Caribe, mas também no pensamento econômico global. Seu trabalho desafiou paradigmas estabelecidos, trazendo novas perspectivas sobre o desenvolvimento econômico que encontraram eco em diversas partes do mundo, especialmente em contextos de economias emergentes e países pobres na África e na Ásia.
 
As contribuições de Furtado transcenderam fronteiras, influenciando debates em países da África, Ásia, América Latina e Caribe sobre os desafios do desenvolvimento em contextos pós-coloniais. Ao redefinir o subdesenvolvimento como um fenômeno estrutural, ele abriu caminho para que nações emergentes analisassem suas próprias trajetórias econômicas sob a ótica da dependência e das relações desiguais no sistema capitalista global.
 
Sua abordagem foi especialmente relevante para economistas e formuladores de políticas públicas em países africanos, que enfrentavam desafios semelhantes aos da América Latina no período pós-independência. A análise de Furtado sobre a necessidade de um planejamento estatal ativo inspirou estratégias em nações africanas como Gana, que buscavam conciliar industrialização e inclusão social.
 
Conexões com Intelectuais Europeus
 
Durante sua brilhante carreira, Furtado estabeleceu diálogos frutíferos com pensadores europeus, como o economista francês François Perroux (1903-1987) e o economista sueco Gunnar Myrdal (1898-1987), Prêmio Nobel de Economia de 1974, que também estudava questões de desenvolvimento regional e de crescimento econômico. Sua passagem por universidades como Cambridge, na Inglaterra e Sorbonne, na França, permitiu que ele influenciasse diretamente gerações de acadêmicos e economistas interessados em compreender as disparidades econômicas globais.
 
Além disso, sua crítica ao modelo de industrialização voltado exclusivamente à exportação encontrou receptividade em escolas de pensamento da França e da Itália, que buscavam alternativas ao domínio do capitalismo norte-americano no pós-guerra. Seus trabalhos ajudaram a consolidar uma visão pluralista no estudo da economia, aproximando o debate europeu das realidades vividas após a Segunda Guerra Mundial (1939-1945).
 
Reflexos na Economia Digital e Globalizada
 
Embora Celso Furtado tenha vivido em um período anterior à revolução digital, suas ideias permanecem relevantes no contexto contemporâneo de globalização. Sua crítica à dependência econômica e tecnológica é revisitada em debates sobre as cadeias globais de impacto da digitalização em países periféricos. Economistas modernos encontram na obra de Furtado insights valiosos para entender a dinâmica de exclusão econômica no mundo digital.
 
Economistas e especialistas contemporâneos encontram na obra de Furtado uma base teórica robusta para compreender especificamente como a desigualdade no acesso às tecnologias, a dependência de software e hardware estrangeiros e a precarização laboral resultante da automação. Suas reflexões incentivam a busca por políticas públicas que promovam autonomia tecnológica e inclusão digital, reafirmando o papel do Estado no fortalecimento das capacidades produtivas internas e na redução da pobreza e da miséria.
 
Um Intelectual Cidadão do Mundo
 
O legado internacional de Celso Furtado vai além de sua obra escrita, porque ele foi um defensor incansável de um mundo mais justo, onde as nações periféricas pudessem se desenvolver sem subordinação às economias centrais. Sua presença em conferências globais e o impacto de suas ideias em diferentes continentes consolidaram sua posição como um dos maiores pensadores do século XX.
 
Celso Furtado não apenas ajudou a moldar o entendimento sobre o desenvolvimento econômico, mas também lançou as bases para que nações ao redor do mundo pudessem sonhar com trajetórias de crescimento mais prósperas, sustentáveis e inclusivas.
 
No Brasil e no mundo, é fundamental revisitar sempre a necessidade de um projeto nacional de desenvolvimento que contemple, além do crescimento econômico, o avanço social, a diminuição das desigualdades regionais e sociais e a proteção ao meio ambiente.
 
20 Anos da Morte de Celso Furtado no Rio de Janeiro
 
Em 20 de novembro de 2004, Celso Furtado faleceu de um colapso cardíaco no seu apartamento em Copacabana, no Rio de Janeiro, encerrando uma vida dedicada ao desenvolvimento econômico do Brasil e da América Latina. Seu falecimento deixou um vazio profundo, mas seu legado continua a reverberar no Brasil e no mundo.
 
Passados 20 anos, sua obra e seu pensamento continuam extremamente relevantes, especialmente em um contexto no qual o Brasil e outros países emergentes ainda enfrentam desafios de desenvolvimento, como a concentração de renda, o desemprego e a falta de políticas públicas estruturantes para diminuir as desigualdades regionais e sociais vigentes.
 
O pensamento econômico de Furtado tem se mostrado visionário em diversos aspectos. Questões que ele já abordava, como a importância do investimento em educação e a preservação dos recursos naturais, se tornaram ainda mais urgentes no Brasil e no mundo.
 
Em um mundo globalizado, cada vez mais competitivo, cada vez mais digital, sua análise sobre os perigos de uma economia dependente e subordinada ao capital estrangeiro ganha novas interpretações, sobretudo diante dos avanços tecnológicos e das cadeias globais de produção em massa. As ideias de Furtado também permanecem vivas no debate sobre a importância do planejamento estatal para direcionar o crescimento e garantir o bem-estar social, aspectos frequentemente ignorados em modelos puramente neoliberais.
 
Uma Parceria de Impacto Intelectual entre Celso Furtado e Rosa Freire d’Aguiar
 
O legado de Celso Furtado não pode ser plenamente compreendido sem considerar a colaboração de sua segunda esposa, a carioca Rosa Freire d’Aguiar, jornalista, escritora e tradutora. A relação entre eles foi marcada não apenas pela relação matrimonial em Paris, mas também, por uma parceria intelectual que ampliou o alcance e a preservação do trabalho de Furtado. Juntos, formaram um casal que contribuiu significativamente para o legado de Celso Furtado no Brasil e no mundo.
 
Rosa Freire d’Aguiar, é a guardiã do legado furtadiano, e reconhecida nacionalmente por sua trajetória como tradutora e escritora, ontem, ela conquistou o Prêmio Jabuti 2024, na categoria Livro do Ano, pela publicação do livro Sempre Paris: crônica de uma cidade, seus escritores e artistas, pela Companhia das Letras. Rosa teve um papel fundamental na divulgação e organização do valioso trabalho de Celso Furtado, assumindo a responsabilidade de preservar sua memória e manter vivo o impacto de sua obra.
 
Celso Furtado escreveu mais de 30 livros, muitos dos quais foram traduzidos para diversos idiomas, como inglês, francês, espanhol, italiano e alemão. Após sua morte no Rio de Janeiro, Rosa publicou livros de Celso Furtado, que reunia correspondências e artigos, que permitiram uma análise aprofundada das ideias e do contexto de atuação de Furtado, preservando e ampliando o alcance de seu legado intelectual.
 
Sua atuação como tradutora também merece destaque, pois Rosa ajudou a internacionalizar as reflexões de Furtado, traduzindo suas obras para idiomas como o francês, o que permitiu que seu pensamento alcançasse audiências globais. Além disso, Rosa escreveu prefácios e notas explicativas que contextualizam a relevância histórica e teórica dos textos de Furtado, conectando-os às questões contemporâneas.
 
Um Compromisso com a Cultura e o Desenvolvimento Econômico
 
Celso Monteiro Furtado e Rosa Freire d’Aguiar Furtado compartilharam uma visão profunda sobre a importância da cultura como elemento central do desenvolvimento econômico. Em sua obra, Furtado argumentava que o desenvolvimento não deveria ser medido apenas por indicadores econômicos, mas também pela capacidade de uma sociedade de produzir e valorizar sua cultura. Rosa, por sua vez, com sua sensibilidade jornalística, contribuiu para expandir esse conceito ao destacar as conexões entre cultura, identidade e política nas obras e debates públicos que conduziu. Rosa já confessou a mídia mundial que seu livro predileto é Criatividade e dependência na civilização industrial, de 1978.
 
Rosa já participou ativamente de círculos de intelectuais no Brasil e no exterior, onde as ideias de Furtado eram discutidas e ampliadas, como o Fórum Celso Furtado de Desenvolvimento da Paraíba, localizado na capital paraibana. Essa troca constante de reflexões e experiências fortaleceu a relevância do pensamento furtadiano, que passou a ser cada vez mais associado a uma visão ampla de desenvolvimento, envolvendo economia, cultura e meio ambiente.
 
Preservação e Atualização do Legado de Celso Furtado
 
Posteriormente ao falecimento de Celso Furtado, Rosa dedicou-se de corpo e alma a projetos como a digitalização de seus arquivos e a criação de iniciativas para disseminar sua obra em escolas, universidades e centros de pesquisa em todo o Brasil. Essa dedicação resultou na criação e fundação do Centro Internacional Celso Furtado de Políticas para o Desenvolvimento, em 2005. O filho caçula de Celso Furtado com a primeira esposa Lucia Piave Tosi, o economista André Tosi Furtado é um dos membros do Conselho Deliberativo. O primeiro presidente foi o economista paulista Luiz Gonzaga Belluzo.
 
Rosa também atuou como curadora de exposições sobre a vida e a obra de Celso, destacando a relevância de suas ideias para os desafios do século XXI. Além disso, sua produção literária e acadêmica oferece insights sobre o contexto em que Furtado viveu e produziu, enriquecendo ainda mais a compreensão de seu pensamento independente e transformador.
 
Um Legado Compartilhado
 
A parceria entre Celso Furtado e Rosa Freire d’Aguiar transcende a esfera conjugal e se projeta como um exemplo de colaboração intelectual que marcou profundamente a história do pensamento econômico brasileiro. Enquanto Celso dedicou sua vida à formulação de teorias e políticas públicas para um desenvolvimento econômico mais justo, Rosa garantiu que essas ideias continuassem a reverberar e influenciar o debate contemporâneo.
 
Juntos, conversando em português ou em francês, formaram uma dupla cuja influência ultrapassou fronteiras, deixando um legado que combina economia, cultura, história e compromisso com a transformação social. Os ares culturais de Paris foram fundamentais para um casal de brasileiros, com saudades do Brasil, sobretudo, por causa do exílio de Celso Furtado, com o Ato Institucional N°1, em 9 de abril de 1964, ele viajou primeiro para o Chile, em seguida, para os Estados Unidos, posteriormente, para a França.
 
Na sua segunda passagem pelo Chile, durante o período em que esteve exilado devido ao golpe civil-militar no Brasil, ocorrido em 31 de março de 1964, Celso Furtado encontrou refúgio na universidade chilena para continuar sua produção intelectual e fortalecer sua atuação no debate sobre o desenvolvimento econômico na América Latina. O país sul-americano, à época, era um importante centro de reflexão para economistas, sociólogos e intelectuais críticos das desigualdades sociais na América Latina e no mundo.
 
Na primeira passagem no Chile, Celso Furtado trabalhou na CEPAL, localizada na Avenida Dag Hammarskjöld, 3477, no bairro Vitacura, na cidade de Santiago de Chile (notável edifício, com uma das melhores arquiteturas da América Latina que se destaca pela sua vista à Cordilheira dos Andes). Posteriormente, o auditório Celso Furtado na CEPAL foi uma justa homenagem a contribuição do economista brasileiro ao desenvolvimento econômico da América Latina.
 
Considerações Finais
 
Finalizando, este artigo foi dedicado as novas reflexões sobre o legado de Celso Furtado, e divulgado ao final da XIX Cúpula do G20, no Rio de Janeiro. É fundamental também apoiar a Aliança Global contra a Fome e a Pobreza, compromisso de 82 países mais a União Europeia (UE) e a União Africana (UA), 24 organizações internacionais como a Organização das Nações Unidas (ONU), 9 instituições financeiras internacionais como o Novo Banco de Desenvolvimento (NBD) e 34 organizações filantrópicas e não governamentais como a Oxfam.
 
Sua rica e vasta obra desafia economistas, líderes e formuladores de políticas públicas a repensarem modelos que priorizem o lucro em detrimento do desenvolvimento sustentável em plena Quarta Revolução Industrial. Celso Furtado foi o primeiro ministro do Planejamento do Brasil, o primeiro superintendente da SUDENE, e o terceiro ministro da Cultura da República Federativa do Brasil.
 
A ênfase de Furtado no planejamento econômico e na autonomia nacional ainda ecoa como um chamado à construção de políticas públicas que coloquem o bem-estar da população e o desenvolvimento das regiões menos favorecidas no centro das prioridades, como a região Nordeste. A criação da SUDENE é um exemplo emblemático de sua visão para equilibrar as disparidades regionais e sociais, reforçando a importância de estratégias que aliem industrialização, infraestrutura logística e inclusão social.
 
Além disso, seu pensamento transcende o Brasil, influenciando debates globais sobre a dependência econômica e as desigualdades sistêmicas que ainda afetam economias emergentes. Em contextos pós-coloniais da África e da Ásia, suas ideias sobre a relação entre economia, cultura e sustentabilidade inspiraram políticas públicas e movimentos sociais em busca de maior autonomia e justiça social.
 
Outro aspecto essencial do legado de Furtado é o papel da cultura como vetor de desenvolvimento econômico. Junto com sua segunda esposa, Rosa Freire d’Aguiar, ele reforçou que o desenvolvimento não se limita a índices econômicos, mas também envolve a valorização das identidades culturais e das capacidades criativas de uma sociedade. Rosa, a viúva de Celso Furtado, com sua dedicação à preservação e disseminação de sua obra, garantiu que essas ideias continuassem a inspirar as atuais e futuras gerações de economistas.
 
Ao mesmo tempo, sua severa crítica à dependência do capital estrangeiro e sua preocupação com a sustentabilidade ecológica são mais atuais do que nunca em um mundo globalizado e tecnológico. A análise furtadiana sobre a economia subordinada e o impacto das cadeias globais de produção em massa ressoa com os desafios contemporâneos, reforçando a necessidade de modelos alternativos que priorizem a equidade social e a preservação ambiental.
 
Finalmente, Celso Furtado faz pensar, repensar que o desenvolvimento verdadeiro só se realiza quando há inclusão social, equidade econômica, valorização da cultura local e com proteção ao meio ambiente. Celebrar seu legado é, portanto, um convite verde e amarelo para continuar avançando nas direções que ele indicou, mantendo viva a busca por um Brasil, uma América Latina e um mundo mais justos, prósperos e sustentáveis. Viva Celso Furtado!
 
Nossas sugestões de obras de Celso Furtado para leitura:

FURTADO, Celso. Formação econômica do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 2007.
FURTADO, Celso. O mito do desenvolvimento econômico. São Paulo: Ubu Editora, 2024.
FURTADO, Celso. Criatividade e dependência na civilização industrial. São Paulo: Companhia das Letras, 2008.
FURTADO, Celso. A economia latino-americana. São Paulo: Companhia das Letras, 2007.
FURTADO, Celso. Obra autobiográfica. São Paulo: Companhia das Letras, 2014.
FURTADO, Celso. Subdesenvolvimento e estagnação na América Latina. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira: 1968.

(1) Economista paraibano, diretor secretário do Fórum Celso Furtado de Desenvolvimento da Paraíba, conselheiro efetivo do CORECON-PB, escritor, palestrante, professor de Economia, autor e coautor de mais de 341 artigos e autor de 18 e-books de Economia, cujo novo e-book é “A Importância do Canadá no G7 e G20”: https://paulogalvaojunior.com.br/canada/. WhatsApp: 55 (83) 98122-7221.
(2) Especialista em Economia e Assuntos Internacionais, Graduada com mérito acadêmico pela Faculdade de Economia da Universidade Armando Álvares Penteado (FAAP-SP) em 2014. Pós-graduada em Estatística pela Pontifícia Universidade Católica (PUC-Chile). Consultora Editorial na Ciência Capital. Colunista Internacional na Rádio Alta Potência (PB) e na Rádio Agro Hoje (MT). CEO de Business Intelligence na BlueBI Solution em São Paulo. Instagram: @bluebisolution. WhatsApp: +56 98484-9704. Linkedin: https://www.linkedin.com/in/katherine-buso/
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