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26/04/2025 às 14h06min - Atualizada em 26/04/2025 às 13h56min

65 ANOS DE BRASÍLIA: O LEGADO DE JK NA CONSTRUÇÃO DO BRASIL

POR PAULO FRANCISCO MONTEIRO GALVÃO JÚNIOR (*)

Paulo Galvão Júnior

Paulo Galvão Júnior

Economista paraibano, autor de 18 e-Books de Economia, conselheiro do CORECON-PB e diretor secretário do Fórum Celso Furtado de Desenvolvimento da PB.

Parabéns, Brasília 65 anos!
CONSIDERAÇÕES INICIAIS

Estimado leitor lusófono do Portal North News, Brasília, inaugurada em 21 de abril de 1960, completou 65 anos em 2025. Mais do que a terceira capital do Brasil, Brasília representa o legado de Juscelino Kubitschek (JK) na construção do país. Criada para interligar os dois Brasis (litoral e interior), promover a interiorização do desenvolvimento e descentralizar o poder político, a nova capital da então República dos Estados Unidos do Brasil representou de forma concreta o audacioso lema: “Cinquenta anos em cinco".

Construída no Planalto Central, Brasília tem monumentos contemporâneos, como o Palácio do Congresso Nacional, conhecido por seu design arquitetônico moderno. A cúpula convexa, menor, voltada para baixo, simboliza o Senado Federal, enquanto a cúpula côncava, maior, voltada para cima, representa a Câmara dos Deputados. Juntas, essas cúpulas icônicas refletem a identidade bicameral do Congresso Nacional.

Entre as cúpulas têm duas torres gêmeas de escritórios, o chamado Anexo 1, com cem metros de altura. O Congresso Nacional é o principal cartão postal de Brasília desde 21 de abril de 1960 e simboliza uma crença profunda num futuro promissor do país mais extenso, mais rico, mais populoso e mais industrializado da América Latina.

A FORTE RESISTÊNCIA DAS ELITES E SETORES CONSERVADORES CONTRA A NOVA CAPITAL

A decisão de transferir a capital, Rio de Janeiro, a Cidade Maravilhosa, para o interior do país, para o Cerrado, foi um gesto político ousado de JK, que enfrentou resistências intensas da elite fluminense e de setores conservadores do Sudeste e Sul.

A elite fluminense, acostumada à centralidade política, cultural e econômica proporcionada pelo Rio de Janeiro e pelo Palácio do Catete, recebeu com desconfiança a construção de uma nova capital no Centro-Oeste. Essa transformação simbolizava uma ruptura com o modelo patrimonialista e litorâneo do Brasil, ao mesmo tempo em que promovia uma visão nacional-desenvolvimentista e integradora do país.

JK enfrentou com habilidade política e senso de oportunidade histórica a resistência à construção de Brasília. Em 1956 com o Catetinho, a primeira residência oficial de JK, começou a construção da nova capital do país pela Companhia Urbanizadora da Nova Capital (NOVACAP), presidida pelo engenheiro civil mineiro e deputado federal do Partido Social Democrático (PSD), Israel Pinheiro, o primeiro prefeito de Brasília.

A CONSTRUÇÃO DE BRASÍLIA NO PLANALTO CENTRAL

Cerca de 60 mil trabalhadores provenientes de diversas regiões do Brasil, os candangos, foram fundamentais para o Plano Piloto, projetado no formato de um avião com as duas asas representando a Asa Sul e a Asa Norte. Esse projeto urbanístico foi concebido pelo arquiteto e urbanista Lúcio Costa (1902-1988) e contou com os traços modernistas do arquiteto Oscar Niemeyer (1907-2012), refletidos na construção do Palácio da Alvorada (primeira obra de alvenaria), Palácio do Planalto, Palácio do Jaburu e Palácio Itamaraty.

Brasília rompeu com os modelos tradicionais ao priorizar eixos de mobilidade urbana, lotes e quadras residenciais bem definidas e monumentos aos Três Poderes da República. Ao redor de Brasília, surgiram cidades-satélites, como Taguatinga, Planaltina, Ceilândia, Sobradinho e Gama, caracterizadas pela alta informalidade, elevado desemprego e falta de serviços públicos essenciais, agravando a vulnerabilidade social de uma enorme população em situação de rua no Distrito Federal (DF).

O esforço de interiorização e modernização do país foi uma das principais diretrizes do governo de JK, cujo objetivo era impulsionar o desenvolvimento nacional por meio de investimentos em setores estruturantes, como energia e transporte, além da construção de Brasília, a nova capital do Brasil, concebida para integrar o vasto território brasileiro.

O PLANO DE METAS: 50 ANOS EM 5

Hoje, pode-se dividir a evolução econômica do Brasil, nos últimos 525 anos, em quatro grandes períodos: o período colonial (322 anos), o período agroexportador (108 anos), o período da industrialização (55 anos) e o período da desindustrialização (40 anos). O governo JK (1956-1961) faz parte do período da industrialização (1930-1985) e o seu lema era "50 anos em 5".

Com o médico mineiro JK, de família de origem tcheca residente em Diamantina, a economia brasileira cresceu 8,1% ao ano entre 1956 e 1960. O economista Ignácio Rangel, do então Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE), foi da coordenação do Plano de Metas, que incentivou o consumo de televisores preto e branco e carros fabricados no Brasil. O plano de JK foi “Preparado por trabalho conjunto do BNDE e do Conselho de Desenvolvimento, sob a orientação de Lucas Lopes e Roberto Campos” (Simonsen; Campos, 1974, p. 59).

O Plano de Metas de JK foi um plano quinquenal e visava acelerar o processo de industrialização na economia brasileira. O Plano de Metas era marcado por 30 Metas setoriais, e divididas em setores de energia (1 a 5), setores do transporte (6 a 12), setores da alimentação (13 a 18), setor da indústria de base (19 a 29), e setor da Educação (30). E a Meta-Síntese era a construção da nova capital do Brasil, entre os paralelos 15º e 20º.

O Plano de Metas em Energia (com Metas de 1 a 5): Energia elétrica, energia nuclear, carvão, produção e refino de petróleo; Transportes (Metas de 6 a 12): Reativar estradas de ferro, construir rodovias (exemplos, Rodovia Belém-Brasília e Rodovia Brasília-Rio Branco), portos, barragens, marinha mercante e aviação; Alimentação (Metas de 13 a 18): Trigo, armazenagem e silos, frigoríficos, matadouros, tecnologia no campo e fertilizantes; Indústrias de base (Metas 19 a 29): Alumínio, metais não ferrosos, álcalis, papel e celulose, borracha, exportação de ferro, indústria de automóveis, indústria de construção naval, máquinas pesadas e material elétrico; e Educação (Meta 30).

Para Kubitschek (1978, p. 19-20), “(...) o Brasil teria que produzir tudo aquilo que constitui o núcleo original do enriquecimento dos povos há mais tempo empenhados na industrialização de grande porte. Industrializar aceleradamente o país; transferir do exterior para o nosso território as base do desenvolvimento autônomo; fazer da indústria manufatureira o centro dinâmico das atividades econômicas nacionais”. Sob a liderança de JK, o Brasil vivenciou uma fase áurea de industrialização, marcada pelo aumento na produção de bens de consumo duráveis, como automóveis, caminhões e eletrodomésticos, e de bens de capital, como máquinas e equipamentos industriais.

CELSO FURTADO: UM OLHAR PIONEIRO PARA O NORDESTE

A industrialização proposta por JK, embora notável, concentrou-se na região Sul e, sobretudo, na região Sudeste. Foi graças à intervenção do economista paraibano Celso Monteiro Furtado (1920-2004) que o Nordeste passou a figurar como prioridade nacional. Furtado idealizou, implementou a Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE) e introduziu o conceito de planejamento regional no Brasil.

Com a criação da SUDENE, a visão nacional-desenvolvimentista ganhou uma nova dimensão, embora insuficiente diante das desigualdades regionais. O Nordeste, antes esquecido, só lembrado pela seca, passou a ser pensado como parte estratégica do projeto de nação. Conforme Kubitschek (1978, p. 203), “Ao regressar do Nordeste, chamei Sete Câmara, subchefe do Gabinete Civil, e, após relatar-lhe a impressão que tivera da seca, disse-lhe: Aquilo não pode continuar. Temos de resolver o problema de uma vez. Desejo que converse com os técnicos que trabalham conosco e encontre uma solução com urgência. Não quero uma providência paliativa, mas uma solução definitiva, apoiada em bases técnicas”. Entra em cena, pelo BNDE, Celso Furtado.

A industrialização brasileira ficou predominantemente concentrada nas regiões Sul e Sudeste, com destaque especial para o estado de São Paulo. No entanto, a criação da SUDENE, em 1959, com sede em Recife, marcou uma iniciativa pioneira para fomentar a industrialização e o desenvolvimento socioeconômico do Nordeste.

A SUDENE representou um desafio para JK diante da resistência dos governadores nordestinos e dos coronéis. Em suas memórias, como o 21º Presidente do Brasil, eleito pelo PSD, Kubitschek (1978, p. 309) recorda as barreiras políticas, “No que dizia respeito à superintendência da futura SUDENE, era violenta a oposição à nomeação de Celso Furtado. Sendo ele um técnico e não um político, os líderes nordestinos iniciaram uma campanha no sentido de que o cargo fosse entregue a um elemento ligado à oligarquia desde muitos anos dominante na região. E era isso, justamente, o que eu desejava evitar. Entretanto, como o anteprojeto teria de ser aprovado antes, julguei prudente dizer aos deputados, senadores e governadores nordestinos que não havia ainda pensando em nomes e que o importante seria a aprovação da lei”.

O presidente JK confiou a liderança da SUDENE a Celso Furtado, que assumiu o cargo de primeiro superintendente em Brasília, em 15 de dezembro de 1959. Posteriormente, Celso Furtado voltaria a tomar posse em Brasília como o primeiro ministro do Planejamento, em 27 de setembro de 1962, no governo João Goulart, e como o terceiro ministro da Cultura, em 14 de fevereiro de 1986, no governo José Sarney.

CRESCIMENTO ECONÔMICO ALTO E DISTRIBUIÇÃO DE RENDA DESIGUAL

O Plano de Metas, de 1956, impulsionou a expansão do parque industrial brasileiro e o crescimento econômico alto. No entanto, esse avanço econômico teve custos elevados: o aumento da inflação e o crescimento da dívida externa e da concentração de renda. Mesmo durante os Anos Dourados, com a Bossa Nova, a conquista do primeiro título de campeão mundial de futebol em 1958, na Suécia, e o Eder Jofre sagrou-se campeão mundial de boxe em 1960, a distribuição de renda permaneceu profundamente desigual.

Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), os 10% mais ricos concentravam 39,6% da Renda Nacional (RN) em 1960, crescendo para 46,7% em 1970, e aumentando para 50,9% em 1980. Enquanto, os 50% mais pobres detinham 17,7% da RN em 1960, caindo para 14,9% em 1970, e diminuindo para 12,6% em 1980.

O presidente JK foi, simultaneamente, um visionário e um pragmático. Seus êxitos nos setores de energia e transporte são inquestionáveis, mas sua falta de atenção à péssima distribuição de renda continua a reverberar no país até os dias de hoje.

O presidente Juscelino Kubitschek de Oliveira (1902-1976) enfatizou no volume III do seu livro de memórias intitulado Meu caminho para Brasília: 50 anos em 5, de 1978: “Nesses cinco anos de governo, o Brasil cresceu cinquenta vezes nos vários setores de sua economia. Mas sua maior meta foi a democracia”. Após fazer o Brasil crescer 50 anos em 5, em 31 de janeiro de 1961, em Brasília, JK passa a faixa presidencial verde-amarela ao seu sucessor, o presidente mato-grossense Jânio Quadros, porém, Jânio renunciou em 25 de agosto de 1961, sendo o pontapé para um golpe que instituiu a Ditadura Militar em 31 de março de 1964, e que durou 21 anos de chumbo.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Hoje, 65 anos depois, Brasília é a linda capital do Brasil e do DF, é sede dos Três Poderes da República Federativa do Brasil, na Praça dos Três Poderes encontram-se o Palácio do Planalto, o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal, é Patrimônio Cultural da Humanidade, pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), desde 7 de dezembro de 1987, e Cidade Criativa do Designer, reconhecida também pela UNESCO. Mas, é o retrato da desigualdade social do país, um grande espelho do abismo social da décima maior economia do mundo.

O legado de JK foi a criação de uma capital moderna que transcende seu tempo. Todavia, Brasília, com a Esplanada dos Ministérios (hoje, 38 ministérios), continua lutando pela reindustrialização para promover um Brasil próspero, justo e sustentável.

Parabéns, Brasília, 65 anos! Que saudades do Aeroporto Internacional Presidente Juscelino Kubitschek, do Memorial JK, da Catedral Metropolitana, da Torre de TV, do Hotel Nacional, da Biblioteca Nacional de Brasília (BNB), dos saudosos tios Gustavo e Elza, saboreando um rodízio de pizzas no Shopping Conjunto Nacional, e do querido primo João Vieira e família no restaurante Roma na Asa Sul. Viva Brasília!

(*) Economista paraibano, conselheiro efetivo do CORECON-PB, diretor secretário do Fórum Celso Furtado de Desenvolvimento da Paraíba e apresentador do programa Economia em Alta na Rádio Alta Potência, na Torre, na capital paraibana.
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